Qual sentido da loucura? O que impulsiona alguém a ser considerada inapta à sociedade? Quão questionável arde esse contexto: beira ao absurdo, louco é quem age com insensatez? A loucura é medida segundo nossa conformidade ao que a sociedade espera de nós. O filme Garota, Interrompida é um estudo sobre os conflitos interpessoais, existenciais e sexuais humanos. Através da personagem principal, Susana Kaysen, observa-se toda a essência da relação da insensibilidade mundana: o foco narrativo é proposto através de uma história verídica, no final da década dos anos de 1960, sobre uma jovem que é internada em um hospital psiquiátrico. Por que a família tomaria uma atitude tão extrema? Para a compreensão, é importante analisar a personagem mais a fundo: Susanna Kaysen acha-se a extrema perdida no mundo, insatisfeita com a vida e, após envolver-se afetivamente e sexualmente com o marido de uma amiga da família, toma a atitude de misturar um vidro de aspirina com uma garrafa de vodca: o ato de suicídio seria contra a frustração de vida? Para ela, uma desesperada forma de curar a dor que invade sua alma, para os outros: apenas a efetiva tentativa de suicídio. Eis que, por indicação dos pais, ela consulta um psicanalista e é diagnosticada com o transtorno Bordeline: distúrbio de limite de personalidade, inconstância comportamental, desintegração da identidade.
A organização Borderline de personalidade vive num mundo escuro, de pesadelo, cheio de "fantasmas" ora perseguindo-o ora culpando-o. Como eles não apresentam uma divisão segura e firme que separa o pré-consciente do inconsciente e não conseguindo utilizar o mecanismo de repressão (alivia mais a angústia), vivem uma dor permanente da qual ele não pode escapar. Somente através de uma terapia psicanalítica este quadro poderá ser revertido. Vivendo, então, em perigo constante dentro de si mesmo, o Borderline fica extremamente ansioso e agressivo. Então, Susanna é direcionada à instituição psiquiátrica, Claymoore, para um período de repouso e reestruturação psicológica. Trancafiada, podada de liberdades, totalmente impaciente - é obrigada a condicionar sua vida dentro da instituição, reavaliar seus atos até então, reorganiza-se intimamente para depois atingir uma nova maturidade. É possível transformar-se plenamente em uma nova mulher?
Dentro da clínica, tensões surpreendentes: Susanna confronta-se com dezenas de garotas insanas, repletas de "doenças da sociedade", reprimidas e também carentes - ela passa a conviver com problemas reais em diferentes graus de enfermidade mental: Georgina Tuskin, uma mentirosa patológica e sua colega de quarto; Daisy Randone, vítima de abuso sexual que se nega a comer na presença de outras pessoas; Polly, vítima de queimaduras que a deixaram com o rosto cheio de cicatrizes e uma baixa auto-estima. E eis que ocorre o embate delicioso: Lisa Rowe, uma sexy sociopata carismática que foi retirada da sociedade e internada pelo seu comportamento corrupto promíscuo, duvidoso e ironicamente perverso. Ao passo que dezenas de "nuances" e personificações de mulheres, ao seu redor, revelam-se - Susanna passa a questionar prioridades, motivos reais e suas verdadeiras vocações de estar ali, socialmente, integrada ao convívio com elas. Será que ela atua com normalidade? Ou é anormal? A sua não-adaptação ali seria devido à sua doença ou, apenas, sua personalidade é mais branda e, contrapondo-se, diferente das outras? Eis que Lisa combate a timidez de Susanna com seu temperamento áspero, altamente sexual, dotada de muita inteligência sensual. O interessante é que, enquanto Susanna condiciona e atenua sua revolta contra o mundo - evoluindo a convivência dentro da clínica, obtendo o prazer social com as amigas "loucas" e excêntricas - sua personalidade ganha novo vigor, adquire uma nova percepção de sua vida. Será necessário viver? Há esperanças?
A direção de James Mangold é emocional, detalhista: aguça as expressões dos atores, prioriza a sensibilidade interpretativa. A montagem adota artifícios do flashback pra sustentar a trajetória de Susanna pré-instituição, a fotografia serena em tons claros e a trilha sonora repleta de hits dos anos 60. Winona Ryder é um misto de introspecção e revolta, totalmente concentrada, transparece toda a complexidade de sua personagem. Contudo, definitivamente, o filme tem maior vigor devido à prestação irretocável e soberba de Angelina Jolie como a sociopata Lisa Rowe: toda a condução da personagem é extrema, desde os diálogos à contextualização interpretativa - torna o filme vibrante, avassalador, febril. Oscar de atriz coadjuvante merecedor! O embate sexual é eficaz entre as duas mulheres: Lisa seduz Susanna com sua amizade, seu desprendimento de mundo, sua personalidade dominadora charmosa. Há uma tensão sexual entre as duas, sutilmente. Pura delícia?
Notórias participações de Whoopi Goldberg, Vanessa Redgrave, Jared Leto e da saudosa Brittany Murphy como uma das internas. O filme evidencia o apreço para a busca pela sensibilidade, o afloramento da sexualidade e um estudo sobre o sentido verdadeiro da loucura - sendo ela tão questionável, cruel ou mesmo relativa. O ser humano merece amadurecer, tanto intimamente quanto dentro da sociedade predatória. Susanna é exemplo de como o ser humano julga o próprio ser humano - condenando-o à própria extinção social. Afinal, ser louco ou não é uma padronização de moldes comportamentais da sociedade. Ou não? Quem há de julgá-lo inapto a viver socialmente? Mas Lisa, dentro de sua sociopatia, obscenidades violentas e virtudes duvidosas, conseguiu extrair de Susanna sua maior virtude: amar a si própria. A ironia é que sua realidade é acordada dentro de um mundo tão ilusório, o manicômio. Exemplo singelo de espetáculo cinematográfico.
A organização Borderline de personalidade vive num mundo escuro, de pesadelo, cheio de "fantasmas" ora perseguindo-o ora culpando-o. Como eles não apresentam uma divisão segura e firme que separa o pré-consciente do inconsciente e não conseguindo utilizar o mecanismo de repressão (alivia mais a angústia), vivem uma dor permanente da qual ele não pode escapar. Somente através de uma terapia psicanalítica este quadro poderá ser revertido. Vivendo, então, em perigo constante dentro de si mesmo, o Borderline fica extremamente ansioso e agressivo. Então, Susanna é direcionada à instituição psiquiátrica, Claymoore, para um período de repouso e reestruturação psicológica. Trancafiada, podada de liberdades, totalmente impaciente - é obrigada a condicionar sua vida dentro da instituição, reavaliar seus atos até então, reorganiza-se intimamente para depois atingir uma nova maturidade. É possível transformar-se plenamente em uma nova mulher?
Dentro da clínica, tensões surpreendentes: Susanna confronta-se com dezenas de garotas insanas, repletas de "doenças da sociedade", reprimidas e também carentes - ela passa a conviver com problemas reais em diferentes graus de enfermidade mental: Georgina Tuskin, uma mentirosa patológica e sua colega de quarto; Daisy Randone, vítima de abuso sexual que se nega a comer na presença de outras pessoas; Polly, vítima de queimaduras que a deixaram com o rosto cheio de cicatrizes e uma baixa auto-estima. E eis que ocorre o embate delicioso: Lisa Rowe, uma sexy sociopata carismática que foi retirada da sociedade e internada pelo seu comportamento corrupto promíscuo, duvidoso e ironicamente perverso. Ao passo que dezenas de "nuances" e personificações de mulheres, ao seu redor, revelam-se - Susanna passa a questionar prioridades, motivos reais e suas verdadeiras vocações de estar ali, socialmente, integrada ao convívio com elas. Será que ela atua com normalidade? Ou é anormal? A sua não-adaptação ali seria devido à sua doença ou, apenas, sua personalidade é mais branda e, contrapondo-se, diferente das outras? Eis que Lisa combate a timidez de Susanna com seu temperamento áspero, altamente sexual, dotada de muita inteligência sensual. O interessante é que, enquanto Susanna condiciona e atenua sua revolta contra o mundo - evoluindo a convivência dentro da clínica, obtendo o prazer social com as amigas "loucas" e excêntricas - sua personalidade ganha novo vigor, adquire uma nova percepção de sua vida. Será necessário viver? Há esperanças?
A direção de James Mangold é emocional, detalhista: aguça as expressões dos atores, prioriza a sensibilidade interpretativa. A montagem adota artifícios do flashback pra sustentar a trajetória de Susanna pré-instituição, a fotografia serena em tons claros e a trilha sonora repleta de hits dos anos 60. Winona Ryder é um misto de introspecção e revolta, totalmente concentrada, transparece toda a complexidade de sua personagem. Contudo, definitivamente, o filme tem maior vigor devido à prestação irretocável e soberba de Angelina Jolie como a sociopata Lisa Rowe: toda a condução da personagem é extrema, desde os diálogos à contextualização interpretativa - torna o filme vibrante, avassalador, febril. Oscar de atriz coadjuvante merecedor! O embate sexual é eficaz entre as duas mulheres: Lisa seduz Susanna com sua amizade, seu desprendimento de mundo, sua personalidade dominadora charmosa. Há uma tensão sexual entre as duas, sutilmente. Pura delícia?
Notórias participações de Whoopi Goldberg, Vanessa Redgrave, Jared Leto e da saudosa Brittany Murphy como uma das internas. O filme evidencia o apreço para a busca pela sensibilidade, o afloramento da sexualidade e um estudo sobre o sentido verdadeiro da loucura - sendo ela tão questionável, cruel ou mesmo relativa. O ser humano merece amadurecer, tanto intimamente quanto dentro da sociedade predatória. Susanna é exemplo de como o ser humano julga o próprio ser humano - condenando-o à própria extinção social. Afinal, ser louco ou não é uma padronização de moldes comportamentais da sociedade. Ou não? Quem há de julgá-lo inapto a viver socialmente? Mas Lisa, dentro de sua sociopatia, obscenidades violentas e virtudes duvidosas, conseguiu extrair de Susanna sua maior virtude: amar a si própria. A ironia é que sua realidade é acordada dentro de um mundo tão ilusório, o manicômio. Exemplo singelo de espetáculo cinematográfico.
22 opinaram | apimente também!:
Oi Cris!
Rapaz de palavra, disse que escreveria sobre o filme e o fez hahaha! Farei o mesmo em breve também, pode me cobrar.
O que dizer? É um filmaço! Levanta uma discussão deveras interessante, é conduzido com esmero, adorei Winona Ryder ter praticamente pisado e cuspido no título "namoradinha da América" com este filme - e tudo veio à tona com aquele episódio do roubo da loja, em 2002 - e "Garota, Interrompida" ainda é abençoado com a atuação irrepreensível de Angelina Jolie, em seu melhor papel no cinema.
Vale muitíssimo a pena. Belo texto.
ABS!
Pra mim que sou psicóloga, foi um deleite ler-te!
Amooo vir aqui.
Pessoas como as vividas nesse filme, supostamente loucas, existem aos montes na nossa sociedade hoje em dia. E eu chamaria isso, não de loucura, mas de pessoas que tem um pouco mais de dificuldade do que a maioria, mas estão longe de ser loucos.
Naquela época o mundo era mais "careta" com relação a esse negócio de "imposição da sociedade", dos costumes certos a serem seguidos e etc...
Esse filme foi o segundo que vi da Angelina, e ali eu vi que ela era uma boa atriz.
O primeiro foi Colecionador de Ossos.
abs
não consegui ainda ver esse filme. mas vou ver se pego na locadora ou fio atento a alguma reprise. quando passa eu sempre acabo perdendo e o filme já tem sempre começado...
Pode discutir comigo, mas ainda acho que Brittany estava perfeita no papel e o melhor de sua carreira.
Tensão sexual entre Lisa e Susanna??? Nunca percebi isso, só acho elas tem uma amizade por coveniência afinal as duas querem siar dali, mas como Susanna é aparentemente a mais sã dali ela descobre mais fácil o jeito de se tornar "normal"
Mas quem somos nós pra discutir um padrão de comportamento adequado pra todas as pessoas seguirem?! Acho que o diretor explora esse ponto no filme. Seu texto está perfeito!!!
Também irei assistir *-*
Ainda não vi esse filme, mas acredito que log vou ver - Isso por causa da maratona Oscar. Olha, adora a Winona Ryder, e só isso já me chama atenção no filme.
Abraço.
Cris,
Anda fazendo uns posts bem caprichados ai né. e.. ah.. mas e escrevendo mais também, percebi nos últimos.
Esse é um filme que nunca assisti, só ouvir falar. Então, logo, seria meio hard pra fazer alguma observação sobre essas "loucuras".
Acho que assistiria mais pela presença de Brittnay, Jolie e Winona... pq o tema não me "cativa" tanto embora me deixe curioso pra sair analisando os pqs das situações. Coisa que fizeste no post, parabéns! Por falar nisso, lembrei tb daquele Veronika.. do Paulo Coelho que já postou por aqui, lembro que na época tb disse q não seria o momento certo pra eu assistir. Tá vendo como eu não esqueço? Quem sabe qndo for ver esse, tb leio, ou vejo mesmo neh, akele.
Esse recurso do flash-back só acho interessante pra contrastar enredos como esse esse, geralmente não é algo que me chama a atenção -- é claro, exceto por Lost, mas já são outros 500.
Poster impactante.
Abraço ^^
Nossa, acredita que tinha apagado Whoppi Goldberg da minha lembrança do filme? Após ler seu texto fiquei um tempo tentando lembrar. Engraçada nossa memória. Depois de Estranho no Ninho, é para mim, o melhor filme sobre a loucura. Passei a admirar Angelina Jolie a partir dele. Enfim, gosto muito.
bjs
Adoro a atuacao da Jolie nesse filme, e da Brittany Murphy (r.i.p).
Ótimo filme e Ótima Angelina Jolie.
eu adoro esse filme!
pra mim, é a melhor interpretação da Winona e da Angelina.
e seu texto é foda!
adorei vc na critica, sem spoiler. meu sonho é conseguir fazer isso.
Ansioso p oscar?
-
Olá, agradeço por ter comentado. Meu blog trata de assuntos adversos, tudo que eu acho importante divulgar, essas coisas. Gostei muito do teu blog, com um pouco mais de tempo, lerei todas suas postagens e já estou seguindo teu blog para estar por dentro de suas atualizações. Até mais, e lerei com toda certeza sobre.
Beijos. :*
Angelina mata a pau nesse filme. Sua sociopata é carismática ao extremo, ainda que bastante egoísta. Sua relação com Winona Ryder é provocantemente dúbia, o que acrescenta um interesse a mais em suas cenas. E Whoopi Goldberg, em poucos momentos bota ordem na bagunça e nos faz sentir uma baita saudade de seu trabalho (volta, Whoopi, o cinema precisa de você!!)
E a trilha sonora é espetacular (destaco em especial a bela "How to fight the loneliness", belíssima...)
Belo filme subapreciado.
Esse filme sempre me deu a sensação de falar sobre a busca de alguém pelo seu lugar no mundo. E ela acabou encontrando pessoas que tinham essas mesmas questões dentro de si.
ainda não vi esse filme... certamente uma heresia cinematográfica!
Presente consistente este post e filme. É difícil lhe responder diversas questões que fez; mas Norman Bates disse: " Todos Nós enlouquecemos as vezes." Mas puta, foi o Norman quem disse, rs!
Filme INTER CINE e DOMINGO MAIOR.
Podia ser mais numa TELA QUENTE, mas ele é interrrompido pra essa sessão!
Saudades da Winona Ryder em grandes papéis. Única chance oscarizável para a sexy JOLIE, que perdeu a chance em A TROCA. E duro pensar na morte da talentosa Brittany Murphy - ela mesma se interrompeu!
Whoopi, Redgrave e Leto - todos acertam!
Abs!
Não reservo especial afeição por Mangold. Contudo, sempre tive curiosidade em ver o filme com o qual Angelina Jolie venceu o Óscar. Ainda não o vi, mas já o tenho gravado na box. Verei em breve!
Cumps.
Roberto Simões
» CINEROAD - A Estrada do Cinema «
Para mim foi a melhor narrativa que já vi sobre o falar de pessoas em sua busca pelo seu lugar no mundo. Parabéns pela visão crítica ...
bjux
;-)
Mais um filme a ser discutido ai, pelo tema polemico mostra a mulher com sua fragilidade no esteriotipo de negação em sociedade...para falar serio Winona Ryder arrebenta...saudades dela tmb como muitos disseram acima em grandes roteiros....filmes maiores....mas o diretor acertou em cheio mostra esse sentido quando se pede o pudor e tem que alcançalo em algum lugar porque não se pode ficar em retraiçao.
No filme relacionado ao tempo que foi posto..a sociedade era entre si uma caretisse, retraição de um corpim belo,, um sorriso forçado..coisas que sao vistas no filme...
Whoppi Goldberg outra que sempre arrebenta em todos os enredos...
vc tmb em Cris..nao para mesmo..sempre mostrando apto a discussao cinematografica e convocando a sociedade o leitor a conferir filmes que chama atençao e que mudam o contexto de todos...
mais uma vez recebe minhas congratulações...
grande abraço
Acho esse filme espetacular.
Desses que toda família tinha que ver, refletir sobre suas responsabilidades, as conseqüências de seus atos...
No cinema nacioanl, costumo associá-lo muito ao "Bicho de Sete Cabeças", onde o protagonista - também encarnando um drama real - sofre a dureza do ambiente manicomial porque a família descobre que este fuma maconha.
Uma saída extremamente questionável, visto que a ausência da disponibilidade familiar em acompanhar e trabalhar, no seu interior os 'problemas' da adolescência, sentencia a vida de seu filho à verdadeira loucura.
Excelente post, Cristiano!
Abraços!
Grande 'pequeno' clássico do cinema.
Lembro que só o assisti em DVD numa indicação do dono da locadora, e fiquei surpreso, já que em outros locais os donos de locadora só recomendam para pessoas como eu filmes de explosão e morte hehehe
[]´s
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