Atração Fatal?

Não é nenhuma surpresa que Hollywood traga ao público adaptações de gêneros já firmados em outras abordagens. Talvez pelo simples fato da crise criativa dos roteiristas ou mesmo por conta da estranha necessidade em testar o mais do mesmo; inúmeros filmes promovem cópias óbvias de outros sem medo do constrangimento que acaba por inferir na plateia, subestimando a inteligência. Fora isso, há a ânsia em explorar questões que envolvem o apelo libidinoso ou mesmo o certo apreço pelo caráter sexual em certos tipos de filmes destinados ao público juvenil. É o caso deste Fixação, dirigido por John Polson, que mergulha no universo mórbido da paixão louca e tinge seu argumento sob as perspectivas da juventude. A trama foca no galã Ben Cronin (Jesse Bradford), o típico jovem bem-sucedido, ex-viciado em drogas, que tenta se estabelecer na natação e no namoro harmônico e sem muita malícia com a namorada com quem mantém um relacionamento bem tradicionalista. Quando conhece a misteriosa Madison Bell (Erika Christensen), a loira estonteante recém-chegada na cidade e que é alvo de tesão por parte de todo território masculino, é que o destino aparentemente apático deste garoto se transforma. Fica explícito que esses dois vão se envolver num jogo de sexo com sérias consequências. Não é surpresa alguma que a trama vai se firmar na trajetória da sexualidade e, posteriormente, no suspense psicótico — já que, após o ato de infidelidade, Ben passa a ser assediado e surpreendido com uma personalidade obscura da moça que não consegue ser apenas a amante de uma noite de transa. Com um roteiro imaturo — com exímias insinuações sexuais e que se assemelha descaradamente ao já clássico Atração Fatal de Adrian Lyne — o filme segue nesse ritmo febril da psicótica Madison traçando o inferno no cotidiano do seu objeto de desejo e compulsão, Ben.

O filme tem uma visão bem rasa, maniqueísta e exagerada — a forma como acentua a personalidade de Madison torna o tom do roteiro até caricato, porém o suspense traz mais conforto que indisposição ao público. Desde o começo é perceptível que existe algo estranho e misterioso no contorno do comportamento desta jovem, ainda que no primeiro ato seja mais evidente o tom sensual e malicioso, já que existe a atração de Madison por Ben logo quando o conhece. O que parece é que o roteiro quer logo acentuar o posicionamento sexual dos jovens centrais — talvez por isso, logo na primeira cena do filme, há uma seqüência breve onde mostra Ben transando com sua namorada, antes mesmo de saber que teria sua vida transtornada por conta de um ato de traição. Ou mesmo a pontuação da libido carnal quando Ben cede à tentação e transa com Madison dentro da piscina. São cenas que exploram essa intenção da sexualidade na tela.

A direção de John Polson nada inova, apenas se permite a essa festival de suspense óbvio, concentrando a narrativa mais na problemática de Ben em se esquivar das intrigas e atos de perversidades exercidas pela moça que demonstra fixação por ele. Possivelmente, o que fica mais reflexivo aqui é a forma como o ser humano costuma se envolver sexualmente com pessoas que mal conhece, tornando-se alvo de desconhecidos que acabam por se mostrar transtornados. É a discussão rasa do sexo casual, do ato de traição e da psicopatia juvenil nos tempos modernos — só que Fixação parece se perder em meio às suas pretensões já que falha em especificar cada contexto desses sensos. Melhor então concluir que seja um filme de suspense de sexo juvenil?

Ainda assim, Jesse Bradford sustenta uma boa atuação diante de tanto clichê e superficialidade nos desenvolvimentos conflituosos. O ator confere certa firmeza e até carisma em determinadas situações. E o público consegue sentir o teor da tensão diante do sufoco que seu personagem vive — se no primeiro ato do filme o foco era em seu personagem ser seduzido; no segundo momento, o público torna-se mais íntimo desse homem que se torna vitimizado por ter se permitido a um ato de luxúria e, com isso, ter seu destino virado ao avesso. Ainda que não seja uma atriz tão expressiva, Erika Christensen favorece sua propulsão maliciosa em cenas onde demonstra tesão e dons manipuladores ao personagem do Bradford — sua limitação interpretativa não impede que faça muito bem o papel da moça rejeitada, ferida e de personalidade psicótica. Mas o que poderia ser até um bom filme sobre questões de infidelidade e suas consequências — ou mesmo um bom discurso sobre a paixão obsessiva — resulta em um trabalho dispensável, quase medíocre, já que o roteiro não garante um sustento mais emotivo e até elaborado. Até a duração — são 93 rápidos minutos, para o bem ou para o mal — acaba por deixar as situações ainda mais sem profundidade, é apenas um tropeço. Contudo, não é novidade que o filme ainda seja visto por muitos adolescentes ou interessados em tramas banais de sexo juvenil e suspense trivial.

Swinfan (EUA, 2002)
Direção de John Polson
Roteiro de Phil Schneider, Charlie Bohl
Com Erika Christensen, Jesse Bradford, Shiri Appleby, Dan Hedaya, Clayne Crawford

14 opinaram | apimente também!:

Kamila disse...

Concordo que esse filme se “inspira” bastante em “Atração Fatal”. Com uma grande diferença que você nota tão bem em seu texto: o tom aqui beira ao caricato, especialmente na atuação de Erika Christensen. O longa é deveras raso e força muito a barra nessas situações de suspense. E, pra ser bem sincera, nem consigo enxergar elementos bons, muito menos na atuação do Bradford. Fica difícil se sobressair em meio a tanto exagero...

Thiago Silva disse...

Não conferi esse filme, mas já não me assusta a mania de reciclagem presente na mente dos criadores hollywoodianos. Fica a impressão de que o cinema já não é um híbrido de arte e indústria em suas mentes, mas um completo e enfadonho caça-níquel.

Ainda bem que temos vários profissionais que levam a sério a ideia de originalidade, ainda que referenciada, em filmes.

Gabriel Neves disse...

Também não vi o filme, mas quero passar longe. Se for pra ver algum, acho que verei Atração Fatal, outro que ainda não pude ver. Por mais que você ressalte a boa atuação de Jesse Bradford, nem isso me faz querer ver o filme.
Um abração!

Ccine disse...

Nem precisa dizer que diante de todos seus argumentos que não assisti, e nem vou quer.
Esse tipo de filme que faz mais do mesmo, não é do meu agrado.
Mesmo não assistindo ao filme, posso dizer seu texto é excelente, bem detalhado.

Júlio Pereira disse...

Não tinha ouvido falar desse filme até ver que seria o próximo a ser comentando no Apimentário. Com isso, fui na ficha dele do IMDB. De cara, já previ algo duvidoso, no mínimo. E fiquei muito curioso pra saber sua percepção acerca da obra. Pois bem, como imaginei, odiou. Até a sinopse soa clichê. Devo passar longe do filme. Essa Erika Christensen, pra mim, é uma desconhecida - nunca vi nada dela -, mas procurei fotos e achei feiosa. hahaha

Muito interessante e pertinente o debate promovido, envolvendo a falta de criatividade em Hollywood. É impressionante como, cada vez mais, ousam menos, criam menos, ficam no conforto de sucessos garantidos. Inclusive, filmes com roteiros originais costumam se destacar, como Árvore da Vida, no ano passado. Ao mesmo tempo, não me importo se, mesmo com uma adaptação, o diretor/roteirista conseguir inventar, entendendo o conceito da adaptação: contar a história através de imagens. Eu mesmo acabo de adaptar dois contos do Allan Poe, para transformar em curtas. Para mim, foi um desafio, principalmente porque são quase todos narrados em 1ª pessoa. Por isso, tão instigante. Se o resultado vai prestar, ninguém sabe. haha

Hugo disse...

Vi várias vezes o trailer deste filme e sempre tive a impressão de ser uma cópia barata de "Atração Fatal".

Abraço

Tiago Britto disse...

Não conheço o filme e depois destes comentários vou passar longe. Volta e Meia os roteiristas fazem coisas legais, mas essas "refilmagens" são um saco e a mesma coisa pode ser vista de novo.

Pelo menos temos uma atuação interessante na obra e alguns momentos verdadeiro de tesão....Quem não conhecer Atração Fatal pode terminar gostando?

Elton Telles disse...

Nunca tinha feito a ligação com "Atração Fatal", mas procede. Vamos deixar claro é quase um crime comparar o filme de Adrian Lyne e essa bobagem juvenil aqui, mas tem certa ligação, sim. Idem aquele filme mané da Beyoncé, saca? Aquele "Obsessão"? Haha, eu tenho que aproveitar melhor meu tempo... rs

Nem lembro de Bradford, cheira, nem fede. Já Christensen eu conheço de outros carnavais e a acho uma ótima atriz. Nesse filme pode ser que a personagem não tenha ajudado, mas quem viu "A Outra Face da Raiva" e, principalmente, "Traffic" sabe que a guria é boa.

No mais, filmeco esquecível, mas até aceitável pelas ceninhas de "curtição" hauahauaha. E aquele final foi uma das cenas mais anticlímax e debilóide da minha adolescência. Fez nem cócegas...


abs!!

Suzane Weck disse...

Não vi este filme e provavelmente não vou ver,mas o texto que redigistes esta bom demais.Parabéns grande escritor.VALEU.abraços.

Otávio Almeida disse...

Belíssimo texto, meu amigo. Como sempre. Sobre o filme, bem, eu até entendo que Michael Douglas tenha traído Anne Archer com Glenn Close. Glenn é bem mais feia. Mas estamos falando de adultos. Casamentos mergulhados no marasmo. Acontece com nove entre dez casais. Eu acho. Coisa de adulto. Pé na cova. Idade chegando. Vontade de ser jovem e irresponsável de novo.

Mas, agora, nessa versão "teen" de "Atração Fatal", o carinha jovem trocar a gatíssima Shiri Appleby por uma aventura sexual com a gordinha Erika Christensen, cara, isso é duro de acreditar. O rapaz só trocaria a namorada por uma Scarlett Johansson. Ou Jennifer Lawrence. Nesse naipe. Gente, ele é jovem. No filme, não é mau caráter. Se fosse mau caráter, até partiria pra cima de qualquer uma, como a Erika Christensen. O cara é do bem. Só vacilou. Agora... Se batesse de frente com uma Mariana Ximenes, ah, não teria jeito. Mesmo sendo bonzinho.

Abs!

Fábio Henrique Carmo disse...

Ou seja, o filme é fraco mesmo. Abraço, Cristiano!

Anônimo disse...

Sinceramente, não podia existir melhor blog de filmes do que este!
Parabéns!
Muito bem escrito, de verdade!
Depois dá uma olhada no meu,ok?
Sou novo por aqui! ^^
http://rele-x.blogspot.com/
Abraço!

Tudo ou nada ... disse...

Realmente, só pode ser fraco rs
Abraços

Jean Douglas disse...

Ao ler sua resenha, tive a leve impressão de já ter assistido este filme. Bom... depois tiro a dúvida! Apesar da demora, venho humildemente expressar a minha opinião a respeito do mesmo. Como sempre, você deixou bem claro com palavras bem construídas o universo ao qual "Fixação" aborda. De fato é um tema bem batido, e é uma pena que este não tenha sido manejado de maneira adequada. Enfim... não tenho muito o que falar, porque de fato não o assisti. Mas adorei seu texto e espero que você continue nos instigando cada vez mais, com suas excelentes construções textuais. Um grande abraço!

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