Obscuridade Sexual

Por que o ser humano sente necessidade de copular com outrem? O enigmático De Olhos Bem Fechados transpõe todas as inquietações das fragilidades dos desejos humanos, é um estudo intimista que pauta os confrontos das tentações da carne e do desespero de uma humanidade que não consegue atenuar os ímpetos da libido desenfreada, da carne que corrompe os preceitos de senso de moralidade. Stanley Kubrick aqui expõe seu olhar cuidadoso com um tom erótico, viabilizando o caráter psicossexual em sua última obra na esfera da Sétima Arte. O filme verbaliza a artificialidade adotada pelo ser humano ao contradizer seus desejos carnais, decorrentes de uma sexualidade que é resultado da primária natureza, ao condicionar-se ao matrimônio que supõe pretender uma aparente fidelidade. Afinal, diante do sentimento do amor - existe regra para não sentir-se atraído por outra pessoa? Como conter a libido que parece se predestinar ao que é proibido? O médico Bill Harford (Tom Cruise) é casado com uma curadora de arte, Alice (Nicole Kidman). A união parece perfeita, casamento com uma filha, nove anos de jornada. A construção da atmosfera do casal sofre logo abalos psicológicos quando, após uma festa onde ambos sofrem assédios - ele é alvo de duas mulheres, ela de um cortês magnata mais velho - a fragilidade transparece num diálogo a dois. Se dentro do lar a aparente união parece ser intensa, a desconstrução desse senso é logo demonstrada quando, num dado momento de intimidade, o casal fomenta um jogo de verdades expostas: Enquanto fumam maconha, Alice confessa ter sentido tesão por um outro homem, a atração teria sido fulminante a ponto dela questionar se seria necessário abdicar de seu casamento e até de sua filha para atirar-se num sexo casual com o desconhecido. É então que o mote da traição ganha vigor no roteiro baseado na obra de Arthur Schnitzler, “Traumnovelle” (História do Sonho), publicado em 1926. A partir daí, perplexo e angustiado, Bill ruma a uma jornada em busca de auto-afirmação sexual, com o ego ferido, numa completa crescente paranóia que desafia até seus próprios limites. Será que a esposa o traiu ou apenas foi um desejo não realizado? Como acreditar já que a mente tende a recriar a realidade como algo mais ainda perverso? Um sonho ou imaginação pode conotar uma traição? O ato de imaginar uma situação sexual constitui esse senso?

A psicossexualidade é todo o centro narrativo do filme, já que a trama segue os caminhos tortuosos de Bill numa Nova York noturna rumo aos seus instintos sexuais. Em seu desespero, nas dúvidas incontestáveis, sem saber ao certo se foi ou não traído por Alice - eis um homem que busca uma masculinidade já sufocada, atormentada, aparentemente despercebida pela esposa que não o desejou tanto. O ser humano nunca consegue parar de desejar o outro? O ato de sexualidade torna-se um sacramento na ótica de Kubrick, pois representa a importância que o ser humano enxerga nesse âmbito - bem verdade, é indiscutível que a força pela fornicação consegue abalar até os mais racionais. Sexo é instinto, é fome, a carne não percorre a linha compulsória do racional: é o emocional que é verbalizado pelo desejo. E o filme, ao expor um casal em crise de identidade de valores da fidelidade, dos princípios da moral e da boa-conduta numa relação, revela-se mais que uma obra orgástica sobre o sexo - é um recorte sobre hábitos e vontades de humanos imersos em próprios dogmas estabelecidos por uma sociedade hipócrita. Desconstrói os tabus, ao colocar não só o homem com vontades carnais. A mulher também sente desejo animal por sexo. Abstendo-se desses rótulos onde se diz que homem é o que faz sexo e a mulher relaciona-se com o sentimento - Bill e Alice personificam essas desconstruções. Pois, tanto ele quanto ela mostram-se fogosos às taras e vontades, além de lidarem com os conflitos dos sentimentalismos próprios. A traição pode ser reconhecida em todas as esferas sociais, na modernidade das relações contemporâneas (onde não se encontram mais fórmulas e tradições de posturas do relacionamento), até mesmo como apenas uma mera vontade de burlar o sistema do tradicionalismo - sim, há pessoas que apenas sentem-se atraídas por trair por querer fugir dos contornos estabelecidos pelos padrões da sociedade. Mas, fidelidade não é algo que deveria ser essencial numa união? Quão doloroso pode ser a traição? A alma e coração ardem de dor.

E Kubrick provoca por colocar dois - um homem e uma mulher - em meio aos seus anseios, aos medos e aos perigos de serem mais ainda vulneráveis à promiscuidade, ao sexo desmedido com outras pessoas. Discute os aspectos de uma relação aberta, de como um amor pode ser retraído diante das perdas de confiança e como uma relação não encontra conforto quando a transmissão da traição não parece ter o manifesto da cura. Bill procura prostitutas para envolver-se num coito rápido, enquanto sua mente não cessa de imagens de transas violentas e selvagens de uma Alice traidora - é o típico homem, sob o machismo, que precisa provar a si mesmo que é apto pra fazer qualquer mulher gozar, ter prazer. O homem que procura outra fêmea para provocar orgasmos múltiplos, já que sua própria mulher o descartou desse setor. E Bill procura o sexo absurdo, talvez assim consiga entender as razões do desejo secreto verbalizado por Alice. É o machismo que não consegue compreender as artimanhas da feminilidade contemporânea - afinal, a mulher também deseja e arde de tesão instintivamente. É o homem que sofre ao ser colocado de lado, é o orgulho masculino ferido que não consegue aceitar ser trocado por outro - afinal, o homem pode desejar e ser desejado. A mulher não.

O ápice da sexualidade no filme atinge quando, na sua odisséia da perversão noturna, Bill vai a uma ritualística orgia secreta. É então que a caracterização, ainda que sutil, ganha contornos mais densos: o aspecto visual e também narrativo da seita sexual é detalhado. Numa espécie de culto epifânico da iniciação de uma orgia, o cenário se assemelha a uma 'missa da luxúria', onde pessoas fantasiadas e mascaradas participam de um bacanal. É neste culto que há as cenas mais viscerais do teor erótico do filme - mulheres nuas, casais transam pelos cantos, caracterizações de sadomasoquismo, ménage à trois. O frisson erótico de Kubrick ganha estilo próprio por externar um erotismo climático sutil, ainda que preenchido de overdoses de personagens que exalam sexualidade - todos parecem predestinados ao desejo, à vontade insana de transar e ser devorado. Interessante a maneira como seu estilo mais clássico aqui se mantém, em cenas longas sem cortes e diálogos ininterruptos que expõem a crueldade da sexualidade à flor da pele.

A química em cena entre Cruise e Kidman é evidente, ambos com atuações bastante intensas. Bill representa um homem que sente a própria insegurança ao vivenciar os tormentos da traição de perto - "é preciso saber viver por cima das traições reais e as imaginárias"? O filme ainda apresenta questões como sentimento de culpa, reparação, arrependimento que são questões presentes em situações decorrentes de experiências - e também abalos - da traição na esfera conjugal. Serve como alerta, pois todo ser humano (querendo ou não, ainda que muitos não aceitem, até pra si mesmo) tende a sufocar desejos obscuros dentro de si. E, às vezes, a traição consegue ser avolumada dentro de pensamentos que persistem em ideias orgásticas - a mente guarda aspectos da luxúria, infâmia e esquenta de obscenidades que não há como conter. É doloroso como nem mesmo um sentimento de amor pode retirar o instinto sexual que o ser humano tem dentro de si. Nítido tapa na cara da intimidade social, dos relacionamentos superficiais e dos humanos que acabam sendo passionais quando o assunto trata-se de sexo. Qual segredo para não trair? O adultério pode levar o ser às loucuras inimagináveis, capaz de evoluir tormentos eternos numa pessoa. O enredo destrói a ilusão - a idealização de que apenas o amor romântico pode fazer com que as pessoas se casem na ilusão de poder possuir o outro; de que a fidelidade neste sentimento lúdico faria com que não houvesse um desejo direcionado a uma terceira pessoa. E o título mostra isso, Bill e Alice estavam de olhos fechados a realidade, mantendo-se na ilusão. Somente Kubrick pra entrar e destrancar as portas da hipocrisia humana neste belo filme intimista, áurea sexual da existencialidade humana.

Eyes Wide Shut (EUA, 1999)
Direção de Stanley Kubrick
Roteiro de Arthur Schnitzler, Stanley Kubrick
Com Tom Cruise, Nicole Kidman, Sydney Pollack, Leelee Sobieski

33 opinaram | apimente também!:

Anônimo disse...

A respeito do tabu da fidelidade, penso que se trata de uma convenção social (mais uma). Há uma canção dos Titãs, que eu gosto muito, que diz: "acabo de te trair em pensamento" e creio que ser esta a situação sinalizada no filme. Os pensamentos não obedecem a convenções; logo, a fidelidade não existe, nem próprio amor, idealizado. "Existem provas de amor, não existe o amor", diz novamente a música.

Outra questão formulada na tua resenha, sobre a qual pensei: por que desejamos? Interessante o questionamento. Afinal, há tantas religiões negando o desejo humano (e cheias de adeptos, mas), por outro lado, ele persiste. Acho que este é um impulso de vida e precisamos dele para seguir.

O que não quer dizer, necessariamente, que se deva sucumbir a cada nova vontade. Até porque, "nem que eu bebesse o mar, encheria o que eu tenho de fundo", dizem os versos do Djavan. Ou seja, os anseios, por completo nunca são atendidos.

É isso o que tenho a acrescentar.
Há um tempo não vinha aqui apimentar, mas foi bom voltar, me fez refletir. Parabéns pelo blogue e ainda mais sucesso.

O Neto do Herculano disse...

Trabalho onírico repleto de sutilezas. Apenas o desejo, não a consumação, faz o filme desenhar seu arco narrativo. Não sei se o espectador de "De Olhos Bem Fechados" é um voyeur por natureza ou se os seus olhos também não se abrem para a realidade. Acredito que Kubrick se despediu em grande forma, apesar do casal Cruise.

Amanda Aouad disse...

Depois de seu texto chego a conclusão de que preciso rever esse filme. Vi há muito tempo quando ainda era muito jovem e mal sabia quem era Kubrick. Mas, lembro de ter ficado impressionada com algumas cenas.

bjs

Paulo Vitor Cruz, ele mesmo disse...

acho q essa coisa de psicosexualidade ainda vai render mta discussão no futuro..

abraço grande.

renatocinema disse...

Assisti esse filme na estréia, no cinema da Avenida Paulista. Afinal, sou fã número 2 de Stanley Kubrick.....Gostei. Mas, esperava mais, muito mais. Entendi que o final do longa as questões levantadas pelo filme perdem um pouco de sua riqueza. Mas, mesmo assim Kubrick é muito acima da média do que temos no cinema mundial hoje.

SolBarreto disse...

Vi esse filme a um tempo ja...e quando assisti me questionei sobre muitos assuntos...
Você os colocou aqui de forma clara...Adorei!

leo disse...

Depois do texto me sinto na necessidade de rever,vi a tanto tempo que tanto não significou como não entendi,agora estou realmente curioso (de novo).
Abraços

Rodrigo Mendes disse...

Gostei do Copular. Rs! Acho que Kubrick é mestre em discutir temas dúbios. De fato os personagens de Cruise e Kidman não olhavam além da esfera de seu matrimônio aparentemente perfeito. Santa maconha Batman, rs..pra fazer revelar desejos e verdades.

Certamente há muitas interpretações nesta jornada do sexo e achei pertinente sua descrição da fita.

Um filme muito psicológico e com um roteiro até técnico na psicologia (como na ciência em 2001 e expressões idiomáticas jovem em Laranja), só que muito subscrito com diálogos onde Kubrick deixa a sua patente.

Também, eu acho que a aventura noturna de Cruise não passa de meros pensamentos. Aqueles cortes dele no Táxi pensando na possibilidade de traição (afinal a mulher dele não confirmou? Ela não aliviada quando o oficial da marinha partiu?) em cada entrecho e depois mergulha em sub-capítulos: a filha do médico falecido, a prostituta, o amigo tocando na nigh club, a garota promíscua na loja de fantasia e a orgia, mostram uma montagem ineficiente atrapalhada depois do falecimento de Kubrick e que prejudicou um pouco o filme.

Creio que Kubrick tinha a intensão de fazer um filme dentro de um "sonhando acordado", que fizesse o expectador raciocinar na metáfora com todos os artifícios do cinema, aliás foi o que Kubrick provou em sua obra do que o cinema é capaz. Enfim!

Mas não deixa de ser uma obra espetacular.

Abs.
Rodrigo

cleber eldridge disse...

Ainda não tive a chance de conferir esse filme, que é tão dividido entre as pessoas!

Kamila disse...

Eu, sinceramente, não gosto muito deste filme. Acho ele muito forçado! Inclusive nas cenas entre o casal Nicole Kidman e Tom Cruise. Olha a falta de química deles.....

Gabriel Neves disse...

bom filme, digo isso. cria a dúvida durante todo o filme, dúvida que vai se construindo em cima de outras dúvidas, criando um misto de confusões no fim. e gostei do retrato que você fez sobre a traição - pensar representa um adultério? será que ela traiu ou não? - e isso afeta realmente no machismo de Tom Cruise.
abraços.

Robson Saldanha disse...

Kubrick é brilhante. Não conferi esse filme, só algumas partes e ele me chamou atenção, portanto preciso ver e assim poderei ler seu texto... hehehe que deve tá mais apimentado que nunca! hahaha

Jonathan Nunes disse...

Ainda não vi esse filme porém depois de ler seu texto irei conferir.

Luiz disse...

Muito bacana ler v. falando de Kubrick. Gosto de maneira espcial de ler o Apimentário quando v. resolve falar de grandes cineastas. Gostei muito dessa sua colocação: "O frisson erótico de Kubrick ganha estilo próprio por externar um erotismo climático sutil, ainda que preenchido de overdoses de personagens que exalam sexualidade - todos parecem predestinados ao desejo, à vontade insana de transar e ser devorado. Interessante a maneira como seu estilo mais clássico aqui se mantém, em cenas longas sem cortes e diálogos ininterruptos que expõem a crueldade da sexualidade à flor da pele".
Lembrando aqui de quando vi o filme, faço minhas as suas palavras. Um abraço!

M. disse...

A química entre o casal (que na época do filme ainda funcionava na vida real) é extraordinária. Taí um filme bom de assistir! Um abraço.

Edilson Cravo disse...

Acho que filmes como esse devem ser assistidos quando se tem uma maturidade suficiente para entender as nuances, as entrelinhas, os simbolismos. Gosto de Kubrick..ele é intenso. Abraços e ótima semana.

pseudo-autor disse...

Não é o meu favorito do Kubrick e acho até que o elenco foi mal escolhido, mas debate uma questão que é feroz nos EUA: a sexualidade exacerbada que existe na América. Pena que o diretor já se encontrava doente quando o realizou!

Cultura na web:
http://culturaexmachina.blogspot.com

Hugo disse...

Minha opinião é próxima da Kamila, não gostei do filme e concordo que faltou química para o casal Cruise / Kidman.

Apesar de Kubrick ter deixado uma bela carreira, não são todos os seus filmes que me agradam.

Gosto de obras como "Dr. Fantástico", "O Iluminado" e "O Grande Golpe", mas este filme citado aqui, junto com "2001 - Uma Odisséia no Espaço", são longas extremamente chatos.

Abraço

Richard Mathenhauer disse...

Como alguém disse acima, depois do seu comentário é bom rever o filme. Aliás, isso se aplica à maioria dos que você taõ bem comenta aqui.

Abraços

Rodrigo Gerace disse...

Falou muito bem sobre as entrelinhas do filme - última obra-prima de Kubrick tão mal compreendida e aceita.

Acrescento apenas alguns detalhes que percebo: Penso que Kubrick quis mostrar que o desejo supra-erótico só faz sentido na imaginação, enquanto fetiche.

no filme, quando este desejo sexual é deslocado para o plano da realidade, ele se torna frígido, asséptico e gelado como naquela orgia sinistra que mais parece uma cena de terror do que uma cena erótica.

Um outro detalhe que vejo é a ambiguidade no casal Cruise-Kidman. Na época, também estavam em crise na "vida real" - dando indícios de que os casamentos fracassados funcionam como um filme fantasioso. E, quando se fecha o olho, aparece o conflito.

O Antagonista disse...

Não vi o filme, mas depois do texto, deu uma vontade imensa de conferir...

Valeu!

Fred Burle disse...

Eu compartilho da confissão da Amanda. Assisti quando muito jovem e também que precisa mais maturidade para assistir algo assim.

Mudando de assunto, encontrei um site que talvez te interesse: http://filmestemag.blogspot.com

Conhece?

Abraço.

P.S.: já disse no meu blog, mas digo aqui também. Retriibuí o voto, afinal, somos rivais, mas nem tanto. Antes um de nós do que outros, não?!

Edson Cacimiro disse...

Um filme para adultos fantástico! A trilha sonora também é ótima.Os atores estão bem. FILMÃO!

Pedro Henrique Gomes disse...

Um filmaço! Nada de decadência do cinema de um mestre. De Olhos Bem Fechados é pura maturidade de um grande cineasta.

Foose disse...

Olá Meu amigo!

Sumi!!! Infelizmente fui atacado por um sabotador, e não tenho mais acesso a minha conta! Perdi o Blog Agente Foose, meu email... enfim, tudo que era vinculada a minha conta!:-( Já algum tempo que temos sido alvo dessa sabotagem. Alguém resolveu destruir o nosso trabalho... apagando e alterando não só textos com horas de esforço e dedicação, mas noites sem dormir e empenho para tentar trazer um blog diferenciado. Durante algum tempo tentamos remediar e concertar a situação gravando e republicando todo o conteúdo, mas agora o meliante, conseguiu trocar nossa senha de acesso. Não desistimos, nem deixamos o sabotador ganhar. Aliás já era tempo de uma remodelação. Já estamos preparando um novo Blog sobre cinema, com novo visual, e sobretudo nova linha editorial sem perder a qualidade alcançado até aqui.
Resta agradecer a você pelo apoio, incentivo visitando o Foose e fazendo manter vivo durante esse curto, mas maravilhoso tempo de vida do Blog!
Bem... Em breve estarei entrando em contato com os detalhes!

Obs: Meu novo email é: agentefoose@gmail.com


Um grande abraço...

Daniel Senos disse...

É incrível como a revelação de um desejo por parte de Nicole Kidman consegue atormentar a masculinidade da personagem de Tom Cruise. Um retrato bastante corriqueiro, essa auto afirmação (falha e por isso, cada vez mais angustiante) que aflige o homem inseguro é, por muitas vezes, a sua própria derrota.

Tullio Dias disse...

"Em seu desespero, nas dúvidas incontestáveis, sem saber ao certo se foi ou não traído por Alice - eis um homem que busca uma masculinidade já sufocada, atormentada, aparentemente despercebida pela esposa que não o desejou tanto. O ser humano nunca consegue parar de desejar o outro?"

Você tinha razão ao dizer que eu iria gostar desse texto. Essa parte em especial, me chamou a atenção e é exatamente o que senti enquanto assistia ao filme.

O cinema ganha muita força quando vivemos situações parecidas em nossas vidas e foi um tapa na cara ver esse filme depois de experimentar muitas decepções em um relacionamento.

Post foda, jovem!
abc

Wenndell Amaral disse...

De Olhos Bem Fechados foi o primeiro filme que assisti do Kubrick. E, talvez, por ter sido o primeiro acho que é o meu predileto dele.

Belo texto, bem à altura da obra.

LuEs disse...

Eu realmente gosto do argumento de De Olhos Bem Fechados porque ele trabalha com algo abstrato: a dúvida. A necessidade que Bill sente em se autoafirmar é tão grande que ele passa a viver em função de suas não-certezas.

O mais interessante do filme é essa motivação. O personagem está tão sem base, infiltrado num submundo perigoso - e tão concreto, o clube, quanto abstrato, sua mente -, que não consegue discernir bem o que é sensato e o que é insensato.

Suas atitudes o distanciam daquilo em direção a que ele pretende ir, mas os seus questionamentos o colocam muito perto de uma liberdade transgressora, sendo essa muito contraditória - ser livre do jeito que ele tenta é mutilar-se, pois isso o afasta de uma imagem pré-concebida dele mesmo.

Decerto esse é um filme interessante, que propõe uma série de questionamento e é exatamente por isso que é válido ver.

Luiz Santiago (Plano Crítico) disse...

Amigo. Estou fazendo um ciclo do Kubrick por aqui. Reli teus textos dele, e gostaria muito (se você autorizar) de publicá-los por aqui.

O que acha?

Marco Galindo disse...

Mais um que acha a cena do bacanal extremamente incômoda.

Filme quase perfeito tecnicamente, mas achei o final meio banal, sem contar que fica uma sensação de potencial de história desperdiçado. Mas enfim, eu o adoro.

Acho que o tema monogamia x instintos sexuais ainda dá muito pano pra manga.

Bianca disse...

Primeira vez que comento no seu blog, de textos bem escritos, e já começo com o pé direito, em um dos meus filmes favoritos, que, como toda obra de arte, possui interpretações antagônicas.
A dúvida que assola a personagem do Tom Cruise o leva a uma jornada de tentações e quase contra-iniciação (à sua essência de homem, médico ético, marido correto) pelo submundo do sexo/prazer desenfreado. Entretanto, a atomosfera onírica que envolvia a jornada, às vésperas do Natal (o filme é carregado de simbolismos, como festins orgiásticos, máscaras, sacrifícios, pentagramas, até vir a redenção), assemelha-se a um delírio, com toques de pesadelo.

Reparemos que Kubrick deixa claro que aquela busca por vingança a uma traição não consumada e a uma quebra de confiança só pode trazer o prazer estéril, impessoal, "frígido, asséptico e gelado", como comentaram. Outro detalhe é que sua relação monogâmica, ainda que abalada, salva-o de alguns perigos da jornada, como a contaminação de AIDS, ao receber o telefonema da esposa, preocupada com seu atraso, como se recobrasse sua consciência.

"no filme, quando este desejo sexual é deslocado para o plano da realidade, ele se torna frígido, asséptico e gelado como naquela orgia sinistra que mais parece uma cena de terror do que uma cena erótica."

Na minha concepção, Kubrick realizou uma defesa do matrimônio, da monogamia e da estabilidade: ninguém e nenhum casal é ou está livre de tentações, desejos, fetiches, muito pelo contrário, ainda mais em uma sociedade cada vez mais sexualizada, desejosa e incentivadora de momentos fugazes e sem maiores vínculos emocionais/afetivos. Agora, na consumação de cada um dos estímulos sexuais definitivamente não está a solução para nenhuma crise na relação ou individual. Só trás ainda mais vazio, dúvidas, tentações, violência, abusos contra si ou a outros, etc.

Enfim, é um filme a ser assistido algumas vezes.

Eliel disse...

Aqui, Kubrick dá a exata ardência sexual que o filme Lolita precisava ter, mas que a época não permitia, lamentavelmente.
É um mega filme que nos faz questionar se sob a certeza do segredo e do anonimato, seríamos capazes de tal liberdade de pulsões.

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