Desejo Obsessivo

Nem sempre o desejo deve ser levado em consideração. E o sexo casual é algo a ser repensado, pois pode conceber a própria destruição pessoal. O diretor britânico Adrian Lyne é um especialista em promover discussões sobre a sexualidade, paixão desmedida e traição sexual que desequilibra a sociedade. Seus filmes tendem a refletir o caráter libidinoso, pois focam em tramas ardentes sobre casais em ebulição e fetichismo secreto. O filme Atração Fatal reflete bem esse senso da atividade da infidelidade, do jogo sexual que fere a harmonia da qualidade de quem é fiel. Na época de lançamento, atingiu um enorme sucesso pela trama instigante que aliava contextos de obsessão, suspense e sexualidade — obviamente, é um filme que se mantém bastante atual, pois trata, em linhas gerais, da trágica história de um homem infiel que se arrepende de seus atos sexuais. E uma trama violenta sobre infidelidade conjugal há de promover sempre o interesse coletivo. O advogado Dan Gallagher (Michael Douglas) tem um casamento perfeito e harmônico com Beth (Anne Archer), com quem tem uma filha pequena. Nota-se que o casal mantém uma união firmada na amizade, sem maiores contatos carnais. É então que o roteiro adaptado por James Dearden exerce seu objetivo: Num final-de-semana, enquanto sua esposa viaja, Dan se envolve num tórrido caso com Alex Forrest (Glenn Close), uma solteira executiva charmosa que conhece casualmente. A atração entre ambos é intensa. Assim, a trama evidencia seu senso sensual inicial, contudo o enredo surpreende pela dose agressiva que os acontecimentos ocorrem. O aparente sexo casual torna-se um apavorante jogo psicótico quando Dan não consegue livrar-se da obsessão de Alex em sua vida. Como se livrar de uma mulher que decide acabar com tudo que construiu? Como conter a ira de uma amante que não quer ser esquecida?

O tom da sexualidade é objetivo na narrativa. Adrian Lyne mostra esse desejo carnal imediato em menos de 20 minutos, quando Dan e Alex promovem seu encontro sexual — transas sexuais agressivas, cruas e diretas na pia da cozinha; trepadas rápidas e sexo oral dentro do elevador e mais cenas ardentes que elevam a temperatura inicial do filme, mostra bem a relação inicial de um homem e uma mulher que nada tem a perder. Apenas há o desejo de transar; a luxúria e a traição segredada. O roteiro mostra este homem que tem um casamento perfeito, mas que busca o sexo fora do matrimônio apenas para satisfazer sua masculinidade que não descarta uma mulher irresistível — afinal, é o retrato do típico machista que vê no sexo casual apenas uma relação sem a existência de laços afetivos. E é justamente essa ausência de afetividade que serve como estopim para a loucura frenética e insanidade comportamental de Alex, uma mulher que demonstra um enorme desequilíbrio por ser rejeitada, sem entender que fora apenas um corpo experimentado. Após as cenas quentes protagonizadas por ambos é que o filme demonstra seu princípio maior: quem é, de fato, essa mulher que não quer apenas o status de amante? Até que ponto a traição pode ser prejudicial? Como um sexo casual pode provocar uma catarse na vida de um ser humano? Alex perde o controle, persegue e ameaça a vida de Dan; violentamente, a femme-fatale torna-se uma psicopata paranóica que deseja destruir, vingar-se do homem que a desprezou.

O filme discute os infortúnios da traição; como apenas um ato sexual com um desconhecido pode levar à loucura. É a história de um homem que transa por uma noite com alguém e se arrepende, põe toda sua vida ao perigo extremo. O ser humano tem o poder de mudar sua vida diante de inúmeros quesitos, sendo o sexo um dos motivos para tal. A representação masculina do personagem Dan exibe bem este senso, pois é um homem que mantém um casamento estável e uma relação tranqüila com a esposa, além do carinho da filha. Mas, não são prazeres suficientes a ponto de torná-lo satisfeito — seria o orgasmo o maior prazer humano? Dan não pensa nas consequências quando transa furtivamente com Alex, mas é após o ato que a consciência pesa e sua conduta é posta em reflexão. E o comportamento psicótico de Alex sobre sua vida faz com que ele viva sob suas armadilhas, num jogo psicológico agonizante. E o filme transcorre nessa teia desesperada, na história de um homem que trai a própria vida, mas que precisa se restabelecer. E como se livrar dos atos impuros? E esquecer do que fez? Enquanto Alex inferniza sua vida e a trama estreita-se mais sufocante, o filme exibe suas tônicas de suspense recheadas de ciúmes, possessividade, malícias.

O apelo perverso se sustenta na caracterização de uma Glenn Close inspirada, através de sua personagem que, ao fim, se mostra vulnerável e passional. A atriz exibe um domínio interpretativo avassalador. Seja em cenas sexuais em que exerce sua feminilidade pervertida em coitos naturalizados ou quando o caráter assombroso e descontrolado de Alex atingem o ápice nas seqüências finais. Seu contraponto é Michael Douglas que sustenta sua virilidade por atuar como representante do homem que não cede às ânsias da carne, da testosterona ativa — o ator concentra seu tom emocional quando passa a ser alvo da obsessão de uma mulher que quer destruir sua vida.

Adrian Lyne prefere articular suas cenas com seu dom emocional, ao invés de realizar desdobramentos mais técnicos, é o apuro cênico que prevalece. Seu cuidado é compor não só as cenas sensuais, mas no jogo psicológico que sua obra sustenta. E a direção consegue ser naturalizada, revestida por uma contida trilha sonora de Maurice Jarre que capta bem o misto da sensualidade e da tensão que a narrativa induz. E o roteiro mostra a condição da rejeição do senso de ser amante; de como a traição torna-se algoz da própria felicidade em vida. A representação de Alex serve como alimento moralista que o roteiro transparece, mas a película não deixa de ser realista por mostrar o lado negativo do sexo casual — nem sempre a busca pelo orgasmo está aliada com o benefício de uma vida prazerosa. É um filme que pauta a condição da instituição familiar sob fortes interferências do abalo da infidelidade conjugal. E por mostrar o arrependimento de um homem que trai, torna-se uma trama necessária. Muitas vezes os atos humanos fogem do controle, traz frutos indesejáveis.

Fatal Attraction (EUA, 1987)
Direção de Adrian Lyne
Roteiro de James Dearden
Com Michael Douglas, Glenn Close, Anne Archer, Ellen Hamilton Latzen, Stuart Pankin

27 opinaram | apimente também!:

Larissa Araújo disse...

E a esposa dele? Ahhh agora fiquei curiosa. Assisti poucos filmes com a Glenn Close e juro que não consigo imaginar ela num filme assim kkkkkk

Thiago Quintella de Mattos disse...

Cara, a aventura sexual, ou a traição sem motivo aparente é avassaladora para o pensamento médio-comum. Quando Gustave Flaubert joga essa na sociedade novecentista da França, ,com MAdame Bovary foi aquele zaralho... aí as pessoas, de bom senso, começaram a perceber o quanto era forte o casamento como sacramento, em vez do casamento como objetivo amoroso. Glenn Close, neste filme, me deixou bolado, com raiva e medo dela. Hoje talvez tenha outra opinião!

Nelson L. Rodrigues disse...

Ótimo filme e ótimo post!

Parabéns!

George Facundo disse...

Adorei esse filme... Glenn Close está impagável. Ela chegou a ganhar o oscar por esta atuação?
A cena final (sem entregar nada, óbvio) é barbara!!!!

Flávio Junio disse...

Joia Cristiano. Gostei muito do seu texto. Muito bem colocadas as suas observações sobre este filme que gerou diversas cópias.

Unknown disse...

"Atração Fatal" foi pioneiro entre tantos outros que vieram depois, e talvez por isso tenha perdido, para alguns, parte de seu impacto. Ainda acho, porém, que a maneira como Lyne constrói a narrativa é exemplar, e que a história não é apenas verossímil como também intrigante. Close estava bem apta ao Oscar (nem sei por que Cher venceu) e Douglas arrebatou o seu, no mesmo ano, por "Wall-Street". Foi um dos primeiros filmes que comprei para minha coleção, adoro "Atração Fatal".

cleber eldridge disse...

Um clássico. Close está simplesmente fantástica!

Gabriel Neves disse...

Fiquei curioso em relação a esse, quero ver mesmo. E depois dos comentários acima, fiquei com mais curiosidade ainda do fim do filme e dessa ótima atuação de Glenn Close.
Abraços.

Kamila disse...

"Atração Fatal", para mim, é um filme, claro, exagerado em certos pontos dramáticos, mas que mostra aos homens que a entrega a uma traição nem sempre é o melhor caminho. Vai que eles se deparam com uma Alex Forrester da vida. rsrsrsrsrrsrsrs

Brincadeiras à parte, essa personagem é uma das grandes vilãs do cinema que eu conheço, em uma excelente e magistral performance da Glenn Close. Mais um Oscar que ela poderia ter ganho, e não venceu.

Luiz Santiago (Plano Crítico) disse...

Glenn Close e Michael Douglas, num filme com úsica do Jaubert? AAAAAAAA!!! PRECISO vê-lo!

Rapaz, gostei da tua reflexão em relação ao desejo. Tenho algumas observações freudianas sobre, mas deixo isso para uma conversa no msn. Por hora, devo dizer que você despertou meu desejo de ver esse filme. Downloading now! =)

Abraço, partner.

Edson Cacimiro disse...

Glenn Close está soberba!

LuEs disse...

Não vejo como tirar nem acrescentar algo àquilo que você escreveu: sua resenha conseguiu descrever também a minha opinião sobre o filme.

Gostei principalmente quando você comentou sobre o tom sexual, afinal, ainda que o sexo não seja um elemento que perdure muito ao longo do filme, as cenas iniciais são suficientes para que fiquemos com aquelas imagens registradas na cabeça por muito tempo. Mais tarde, somadas àquelas imagens, temos a fotografia nítida de uma Alex completamente perigosa - não consegui em momento nenhum desvencilhá-la da concepção do sexo selvagem. Para mim, ela é uma das personagens mais sexuais do cinema, exatamente porque nela há loucura, paixão e ausência de remorso.

Eu só não acho que o filme como um todo seja tão magnífico assim. Gosto dele, atribuo-lhe qualidades, mas não o elevo demais - ele não me cativa a ponto de colocá-lo na minha lista dos melhores filmes já vistos.

Amanda Aouad disse...

A cena do coehinho foi a que mais me marcou na primeira vez que assisti esse filme, hehe. Ótimo texto, você destacou bem a tensão da traição e arrependimento de Douglas. E a loucura de Close.

bjs

Hugo de Oliveira disse...

Esse filme é ótimo...muito bom mesmo.

abraços
de luz e paz

Mayara Bastos disse...

Glenn Close está uma monstra nesse filme! rsrsrs. ;)

Wallace Andrioli Guedes disse...

Vi há muito tempo, mas acho um filme apenas bom. Vale mais pela Close mesmo. Nunca fui muito fã do Lyne, acho o cara meio sem talento, seus outros filmes que seguem mais ou menos essa linha (PROPOSTA INDECENTE, INFIDELIDADE) são fracos...

pseudo-autor disse...

Esse é daqueles filmes que eu nunca canso de assistir! Glenn Close está fantástica. Pena que o cinema não ofereça mais personagens à altura do seu talento (tudo agora é super-herói e vampiro!).

Cultura na web:
http://culturaexmachina.blogspot.com

Edilson Cravo disse...

O filme é perfeito como qq bom thriller tem q ser: envolvente e inteligente. Você escreve maravilhosamente bem. Dá vontade de rever os filmes q indica. Lindo fim de semana Cris.
www.lua2gatos.blogspot.com

Fábio Henrique Carmo disse...

Na minha opinião, Adrian Lyne sempre faz o mesmo filme.Abraço!

Cristiano Contreiras disse...

LARISSA:

Assista pois é um filme intrigante! rs

THIAGO QUINTELLA DE MATTOS:

O filme demonstra bem essa relação da traição com a redenção...o arrependimento de um homem que cometeu o 'pecado' de trair...Glenn Close está mesmo incrível no filme! Abraço!

NELSON L. RODRIGUES:

Obrigado!

FACUNDO:

Close está mesmo impagável, eu acho que ela merecia o Oscar. A cena final é angustiante!

FLÁVIO JUNIO:

Obrigado!

WEINER:

Eu ainda acho que o filme é bem impactante. Um absurdo Cher ter vencido, Close está soberba neste filme. Eu tenho o dvd dele também, mas revi em blu-ray!

CLEBER:

Clássico mesmo!

GABRIEL:

Pois veja, quero ler seu texto sobre o filme!

KAMILA:

Eu acho que o filme é melodramático um pouco, mas a trama é até realista. Apesar do final moralista, típico de Adrian Lyne. Também acho que Glenn Close deveria ter ganho o Oscar!

LUIZ SANTIAGO:

Nunca viu o filme? Pois, trata de ver e logo! Rs!

EDSON:

Está soberba mesmo!

LUES:

Obrigado pelas palavras.

Eu quis ressaltar o tom sexual do filme, mas ele não é só isso.

A questão da loucura também é presente na personagem de Glenn Close.

E não disse que é um filme magnífico, mas acho que tem seus méritos.

AMANDA AOUAD:

A cena do coelho é assombrosa mesmo! Boa observação! Beijão!

HSLO:

Um filme bom mesmo! Concordo!

MAYAR BASTOS:

Close é uma atriz e tanto, né?

WALLACE ANDRIOLI GUEDES:

Eu não sou fã de Lyne, mas gosto bastante dos seus filmes sexuais. rs! Eu gosto muito de "Infidelidade". E "Proposta Indecente" é um filme a ser discutido...em breve aqui!

PSEUDO-ATOR:

Eu também não me canso. Já vi o filme umas 4 vezes!

EDILSON CRAVO:

É um filme envolvente mesmo. Obrigado pelo elogio!

FÁBIO HENRIQUE CARMO:

Eu acho que Lyne faz filmes sexuais, sobre temas de desejo e libido. Não acho que as tramas dos filmes se repetem...

Rodrigo Mendes disse...

Impossível ignorar este filme. Ele não é apenas uma sessão de fim de semana. Rs!

Abs.

AnnaStesia disse...

O melhor filme de Adrian Lyne. Sem dúvida! Glenn Close está espetacular!

Cristiano Contreiras disse...

RODRIGO MENDES:

Impossível mesmo..e é um filme que a sexualidade é forte, portanto, precisei degustá-lo, rs.

ANNASTESIA:

Eu prefiro "Infidelidade", mas este também é incrível!

Matheus Pannebecker disse...

Não sei, mas acho que "Atração Fatal" não envelheceu muito bem... De qualquer forma, a atuação da Glenn Close continua irretocável!

Clenio disse...

Quando assisti a esse filme eu era pré-adolescente e lembro que ele me excitou muito (tendências violentas, mas enfim...)
Hoje eu percebo mais claramente suas implicações quase reacionárias, que defendem o casamento e a fidelidade acima de tudo e colocam uma mulher liberada e solteira como vilã.
Apesar disso, ainda considero um ótimo suspense, com uma Glenn Close absolutamente inesquecível.

Abração
Clênio
www.lennysmind.blogspot.com
www.clenio-umfilmepordia.blogspot.com

Paulo disse...

Oi, querido. Passando pra visitar seu blog. Adorei! Parabéns pelo espaço

Anônimo disse...

"um homem e uma mulher que nada tem a perder."

Estabelecemos relações baseadas na lógica do perda e do lucro?

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