Amar é sofrer?

A versão cinematográfica de 1992 de O Morro dos ventos Uivantes é o tormento do ciúme incondicional. A relação do cigano Heathcliff com Catherine Earnshaw é condicionada na possessividade maculada: é presente também, dentro da amplitude tensa sexual do relacionamento, a dualidade de amor e ódio, o desejo e a repulsa, representam a passionalidade de Heathcliff e a submissão de Catherine. O terreno é na área rural da Inglaterra em pleno século XVIII. A essência da sentimentalidade sinistra do ardente livro de Emily Brontë é transposta no filme: a trilha melancólica de Ryuchi Sakamoto torna as cenas um belo panorama nervoso e emotivo. Não existe ser mais atormentado em ciúme doentio que Heathcliff. Ralph Fiennes dá o sangue para personificar o amante idealizado por Brontë, repleto de nuances e imperfeições psicológicas e comportamentais - Juliette Binoche é a pureza da mulher idealizada. Seu desejo de impor seu amor selvagem a Catherine revela um tom maquiavélico. Por ter sido criado desde pequeno como irmão adotivo de Cathy, criou-se um forte elo entre ambos, mas o abalo surge quando ele toma consciência de seu casamento com outro homem, Edgar Linton. Heath, inconformado, foge e volta vingativo e rico para infligir a vida de Cathy. Seria ele um passional maldito? Catherine jamais consegue se esquivar da rebeldia sentimental indomável do ex-cigano - sua personalidade submissa era reflexo de sua delicadeza e fragilidade. A relação se sustenta nesse exercício de dor e prazer a dois. O amor é uma dor ou ardor?

No filme a paixão motiva os amantes. Como estar livre do ciúme? A crueldade deste ciúme é o argumento do melodrama: o filme todo é esteticamente depressivo, soturno. Heath e Cathy sofrem de amor e é comovente. Heath é um ser que se endurece, se auto-flagela, por amar demais, a ponto de ser egoísta. É uma delícia ver a cantora Sinead O'Connor como a narradora Emily Brontë, sua caracterização é quase mística. O prólogo do filme, open scene, é altamente impactante.

A adaptação cinematográfica prioriza praticamente todos os elementos do livro, há fidelidade por parte da roteirista Anne Devlin e na direção crua de Peter Kosminsky, pois detalha expressões até intimistas do par central. O acentuado teor do melodrama melancólico é mesclado ao romance trágico. Paixão depressiva? O amor é emulado com o ódio em atuações obtusas. Um exemplo de trabalho de pura emotividade cinematográfica, graças à verve clássica literária. Um filme vigoroso com muito esmero visual.

28 opinaram | apimente também!:

As Tertulías disse...

Maravilhosa postagem sobre um bonito trabalho (apesar de eu gostar muito da versao de 1939... apesar de só contar "metade" da estória!). Meus parabéns... voe nos "prende" aqui com seus magníficos comentários!!!

BF Junior disse...

Muito boa a crítica Cristiano, está de parabéns!!

Não assisti O Morro dos Ventos Uivantes ainda, mas sempre tive vontade!! Adoro o Fiennes e a Binoche!! Sou obrigado a assistir um dia desses!!!

Um abraço!

Rodrigo Mendes disse...

A obra é cativante. Apimentou bem!

Mas como gosto de filme velho (filme velho que faz uma sessão boa)..prefiro MIL vezes a versão com Laurence Olivier.

Abs!

Unknown disse...

Um isso da para pensar mesmo...mas vou ver essa indicação...muitas vezes amar é sofrer sim....odo relacionamento sofremos um pouco nao é?

abraços

Felipe disse...

Eu vou ser sincero e cruel: Não gosto desse livro. O filme pode ter ficado muito bom e ter passado todas as emoções que o livro falha em passar, mas ainda sim a história não me agrada.
Mas, a adaptação serve muito bem aos seus propósitos, não há dúvida, e a sua crítica detalha muito bem esse aspecto.

abraços

Clenio disse...

Oi, Cris

Como já conversamos, ainda não asssisti a essa versão do livro, por gostar muito da versão com o Laurence Olivier e desconfiar da opção de Ralph Fiennes como um cigano e Juliette Binoche como uma inglesa (ainda que admire muitíssimo o trabalho de ambos).
Mas como confio em ti ainda vou arrumar um tempinho pra conferir hehe
Bom fim de semana. Abração

Gema disse...

Nao vi esta versao da Binoche/Fiennes, ms a versao de Laurence Olivier e Merle Oberon e '39.
Gostei imenso do classico adorei ler o livro e tenho alguma curiosidade nesta versao.
Bks

Cristiane Costa disse...

Oi Cris,

Acho esta obra literária incrível sob o ponto de vista desta paixão ciumenta que escraviza Heathcliff que, na minha opinião, deixa de amá-la para vingar-se a todo o custo de ter sido ignorado, logo o ciúmes o enlouqueceu e o fez se afastar do sentimento de amor enquanto conquista. Por isso acho que amor não correspondido que humilha o outro pode ir para uma escala de raiva e ódio e muito ciúmes, com a possibilidade de ou ignorar o objeto amado (até para não sofrer mais ainda esta proximidade) ou simplesmente odiá-lo e fazer o mal, dar o troco de alguma forma.

Heathcliff dá o troco, um homem muito amargurado do qual tenho muita pena. Cathy tb é bobinha, este filme me dá a impressão que ela é fraca demais para lidar com a loucura amorosa de Heathcliff.

bjs!

Amanda Aouad disse...

E por que tem que ser assim, né? Por que o amor tem que vir com esse sentimento de posse e insegurança que gera tanto ciúmes? Gosto da história e da forma como o filme expõe isso, mas não gosto desse rima de amor e dor tão própria dos melodramas.

abraços

Wesley Bezerra disse...

acabei aqui por acidente e gostei, anotei a dica! Volto mais vezes certeza

Juliana Góis disse...

Definiria com a palavra "intrigante".
Gostaria de ver a versão antiga com Larry Olivier.Talvez seja tão boa quanto essa versão, mas será dificil.

Jardel Nunes disse...

Adoro esse filme, todo o visual dele, as cores, os sons... atuações magnificas.
Percebi que tenho que assistir de novo hehe
Abraços, e ótimo texto

Cristiane Costa disse...

Oi Cris,
Pensei sobre a pergunta do seu post e voltei aqui para respondê-la. Eu acho que amar é sofrer se você ama alguém que não te ama em retorno com o mínimo de respeito, carinho, lealdade e intensidade. No lance do amor amoroso mais também carnal não tem este lance de ser incondicional, todo mundo espera uma recíproca genuinamente verdadeira, a não ser que seja um(a) masoquista que adora viver um sofrimento gratuito. Se a pessoa amada não passa esta confiança, penso que dá abertura a ciúmes e qualquer tipo de insegurança e rancor (salvo os casos já doentios de ciúmes sem qualquer motivo).

Quem acha que ama e alimenta uma relação doentia com o outro acho que se adequa mais a ter um tipo de doença afetiva que pode ser paixão alucinada, dependência ou qualquer coisa que não seja amor.

Agora, amar é mais sofrer se você ama alguém que não te dá a mínima, por isso HeathCliff se ferrou de tanto ciúmes e também ferrou vários ao seu redor. Para falar a verdade o amar no sentido de sofrer deveria se chamar "apaixonar-se". Basta lembrar que paixão = sofrimento.Vide como exemplo " Os sofrimentos do Jovem Werther" de Goethe, um dos meus livros de literatura alemã preferidos. É tipicamente uma história de amor no sentido de sofrimento, que dilacera o coração de Werther.

Já aconteceu comigo de eu amar alguém que não estava preparado para me amar dada a imaturidade do moçoilo e até mesmo por não me amar mesmo, acho que foi realmente um amor muito leal de minha parte e eu sofri horrores por ser fiel a este sentimento, até o dia que "caiu a ficha" e o que eu sentia não era mais amor, era libertação. Eu estava livre, leve e solta(rs).

Bjs da MaDame!

Apareça lá no meu cantinho, saudades d'ocê!

Zeka Viola disse...

Lindo blog, boa crítica. Ainda não vi nesta versão. Gosto do Fiennes e da Binoche, também da música do Sakamoto, enfim, o ciúme é atroz e o romance é muito bem contado pela Brontë, um clãssico que vale ser revisto!

Paulo Roberto Figueiredo Braccini - Bratz disse...

perfeito ... põe vigor e esmero nisto ... uma obra à altura da preciosidade de Emily Brontë ...

adoro isto aqui

bjux

;-)

Paulo Alt disse...

Cris,

Dizem que essa é a mais perfeita adaptação do livro para ao cinema. Li o livro mas faz alguns anos já. Assisti essa [tenho em dvd] e uma em preto e branco de 1939 com aquele Lawrence Olivier, tenho baixado aqui.

Poxa! Como foi que não adivinhei esse post? Irmãos Fiennes + essa sua última passada por Twilight.... haha, engraçado eu abrir aqui e ver esse.

Logo no comecinho do texto você falou da trilha sonora... eu posso ter esquecido boa parte da trama e detalhes mas que bom que também foi uma coisa que chamou atenção pra vc. Lembro +-, não é uma que tem umas flautas no meio? algo meio melancolicamente cigano e antigo ao mesmo tempo.

Parabéns por trazer ele aqui ao blog, são personagens que voc~e caracterizou muito bem e encaixam certinho no universo apimentário, não é não? Eu nem tenho o que falar pq se não vou ficar aqui te elogiando e eu já fiz isso várias vezes, vai ficar repetitivo e vc vai se cansar de ler meus comentários rsrsrsrs. As última slinhas de texto classificam teu blog mesmo percebeu? =P

Abraçoo meu Amigo ^^

joyce Pretah disse...

um ótimo filme.....ótima resenha.....

amar é sofrer sim....infelizmente é algo inevitável.....e muito dolorido....

bjbj

Serginho Tavares disse...

até hoje é o livro mais chato que eu li
o que dizer do filme? odiei

Ranger Azul disse...

Cris, crítica muito boa, como sempre.

Eu, particularmente, acho Ralph Fiennes um excelente ator.

O lance entre amar e sofrer exige uma análise bem definida, e é essa a base que o filme segue, mas se eu falar minha opinião ficarei horas aqui.

É um bom filme. Me deu vontade de assisti-lo novamente.

Abraço.

it was RED - Para quem gosta de cinema disse...

Desculpa a ausência no teu blog, mas fiquei um bom tempo sem computador.

Não conheço essa película, mas tu aguçaste minha vontade de assistí-la. Abraço!

Ygor Moretti disse...

Putz ainda não vi, o livro está na minha fila aqui, aquela fila de livros interminaveis que so aumenta rsss.

abraço!!

História é Pop! disse...

Assisti dois filmes sobre uma das histórias mais densas, complexas e cheia de amor e ódio de todos os tempos, “O Morro dos Ventos Uivantes”. Desde sua origem, no século XIX essa obra literária é polêmica. Sofreu críticas inúmeras na época em que foi escrita, afinal mostra a degradação de duas famílias em todos os sentidos e níveis possíveis. É interessante ressaltar, que mesmo sendo uma obra literária intensa e que perdura por séculos a autora do clássico escreveu apenas este livro. A história é tão marcante que já passou por quatro adaptações diferentes. Assisti apenas duas destas filmagens, uma de 1939 dirigida por William Wyler, onde Laurence Olivier é Heathcliff e Merle Oberon é Catherine Earnshaw . A outra é de 1992 mais completa porém achei menos cativante. Onde Juliette Binoche é Catherine Earnshaw e Ralph Fiennes é Heathcliff.
Mesmo narrando apenas uma parte da história, “O morro dos Ventos Uivantes” de 1939 é mais poético, doce, triste e ao mesmo tempo melancólico, que “O Morro dos Ventos Uivantes” de 1992.
A forma como Laurence Olivier demonstra ser Heathcliff é muito mais intensa que Ralph Fiennes . Você vê a angústia de ser dominado por sentimentos inexplicáveis expressa em seu semblante, nos seus movimentos e em seu tom de voz. Já Ralph Fiennes mostra um Heathcliff menos marcante. Vendo os dois filmes, acabei também comparando a atuação de Juliette Binoche com a de Merle Oberon que demonstra muito mais as características que Catherine deveria ter segundo a obra literária ou seja, a de uma Jovem mimada, de espírito livre, que ama Heathcliff tanto quanto ele a ama, porém não o considera digno de que seja seu marido.
vale ressaltar que o filme de 1939 foi Indicado a oito Oscars, incluindo o de “Melhor Filme do Ano”, mas levou somente a estatueta de “Melhor Fotografia em Preto-e-Branco”, perdendo a maioria dos prêmios para “ ...E o Vento Levou".

ESCREVI SOBRE OS DOIS FILMES JA FAZ TEMPO EM UM ANTIGO BLOG

bjim

Danilo Ator disse...

Bela postagem. Esta é sem dúvida uma ótima adaptação para o cinema, onde a direção capricha no tom soturno, e isso me atrai muito.

LuEs disse...

Infelizmente, eu não tive a oportunidade de ver esse filme. Conheço apenas a obra literária, que é linda e densa, com uma proposição magnífica de um amor catártico e ao mesmo tempo descortês.

Quero mesmo ver esse filme, porque quase todos o elogiam e acredito que seja mesmo bom - ou que pelo menos se assemelhe ao livro.

Quando puder, vou vê-lo.

Luis Galvão disse...

Belo texto! Também o acho um bom fiilme, mas prefiro muito mais o romance em si.

Medeiros Alencar disse...

A obra é divina... Emile Bronte escreve de uma forma sombria e romântica q nos prende ao livro de forma enigmática. Vi o filme, boa adaptação. Tem outra adaptação, bem adolescente, não é nada boa.
Abraços
E vlw por ter ido no meu blog, q bom q gostou. Espero outras de suas visitas;

Anônimo disse...

good points and the details are more precise than somewhere else, thanks.

- Thomas

Anônimo disse...

Tava procurando os posts aqui e eis que acho este! Esse filme é meu filme preferido acredita? E o livro tb.

Esta historia da mto pano pra manga, ha quem diga que nao é uma historia de amor. Sei la, da pra refletir mto a respeito. Afinal, considerando que cada um tem uma forma de amar, a furia de heathcliff foi sua unica forma de expressão diante do modo futil e egoista de catherine de amar.

Este filme esta repleto das melhores citações do livro e eu acho intenso demais a cena de Heathcliff abraçando catherine morta no caixão. Amo amo amo!

Bjs

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Aperitivos deliciosos

CinePipocaCult Sociedade Brasileira de Blogueiros Cinéfilos Le Matinée! Cinéfila por Natureza Tudo [é] Crítica Crítica Mecânica La Dolce Vita Cults e Antigos Cine Repórter Hollywoodiano Cinebulição Um Ano em 365 Filmes Confraria de Cinema Poses e Neuroses